sábado, 6 de dezembro de 2014

X - A EPIDEMIA EBOLA:

DO COMEÇO AO FIM:
SOBREVIVÊNCIA, CURA E ESPERANÇA

Entenda um pouco sobre o vírus causador da doença considerada por muitos a mais devastadora já descoberta na história da humanidade.





“A Libéria está dividida por uma cerca dupla laranja. Ela foi construída para manter a doença sob controle, para nos separar (os saudáveis, os privilegiados) deles (os doentes, os necessitados). Construímos a cerca para nos sentirmos menos mortais”.
Ane Fjeldsæter, Psicóloga, 31 anos




O vírus Ebola começa a se disseminar em meio às células do fígado, pulmão, tecido linfático e baço, causando danos significativos e as tão temidas hemorragias, que lhe são estigmas, e que já tiveram suas causas explicadas em postagens anteriores. Logo aparecem os primeiros sintomas, e ainda aí, devido a todo um mecanismo bioquímico eficiente, o sistema imunológico atingido não tem noção de que está sob ataque. Munido das proteínas e glicoproteínas próprias, o Ebola instala-se eficientemente, burlando nossas defesas de forma engenhosa (leia mais sobre os aspectos bioquímicos das doenças nas postagens 6, 7 e 8), e começando a agir através de uma febre alta e repentina, dores musculares e na cabeça, inflamação dos olhos, perturbações cerebrais, e em demais órgãos, diarréia, vômito, dificuldade para respirar, erupções na pele, e muitos outros sintomas já discutidos, que se seguem em uma longa lista, que torna o doente debilitado, fraco,   e principalmente, o priva do carinho, e toque dos demais. Depois, como já se sabe, seguem-se as hemorragias internas e externas, e a partir deste ponto o Ebola torna-se mais sombrio, tanto pela rapidez com que se instala, como pelo sofrimento que provoca. O nariz, a boca, e os olhos sangram, o cérebro começa a ser destruído, convulsões epilépticas tem mais chance de ocorrer, a superfície da língua se desfaz, assim como o revestimento da traquéia e da garganta, os rins sofrem perdas funcionais, o fígado incha, a pessoa passa a vomitar sangue, com pedaços do intestino, e então, a morte enfim chega, quase que como em resposta e dotada de certa piedade, frente ao sofrimento.



Entretanto, mesmo diante de tudo isso, há chances de cura, que derivam de uma luta veemente contra a morte, vivenciada por pessoas que moram em países africanos assolados pela fome e miséria, e com um atendimento médico precário e ineficiente, que felizmente, diante da crise de Ebola deste ano, tem ganhado apoio internacional de instituições, como o MSF, (Médicos Sem Fronteiras), que mesmo em meio a um mundo frio, luta incessantemente para sanar esta Epidemia. 
Sim, o Ebola é um vírus muito letal, que mata, em média, 6 em cada 10 pacientes infectados, e é verdade que já levou 4000 vidas e continua sendo uma enorme preocupação em todo o mundo É verdade que a epidemia já levou mais de 4 mil vidas e continua sendo uma enorme preocupação, mas há chances de sobrevivência, e mais: pessoas que conseguem alcançar a cura, e a partir daí, inspiram a recuperação de pacientes, e dão força para os profissionais de saúde continuarem lutando, e chegam até, em alguns casos, a voltar aos centros de tratamento, e, como forma de agradecimento por terem sido salvos, trabalham em prol da vida de outras pessoas. 


Hoje, na última postagem deste blog, depois de comentar bastante a respeito do vírus Ebola, (descobrimento da doença, sintomas, contágio, tratamento, sociedade africana, e muita bioquímica, dentre outros diversos temas), iremos discutir um pouco sobre a cura desta doença, sobre a sobrevivência e a esperança, e sobre todo o trabalho humanitário que muitas instituições têm realizado, tendo tais palavras como base.



Ebola: A cura

Como já foi demonstrado em postagens, anteriores, o Ebola possui mecanismos bioquímicos importantes que lhe dão a garantia de burlar o sistema imunológico e atingir o organismo humano. Como não existem medicamentos ou vacinas, a cura da doença depende apenas do sistema imune de cada paciente, e da ajuda médica oferecida. Há, entretanto, maior chances de sobrevivência caso o paciente esteja bem nutrido e possua um organismo resistente, (o que infelizmente não é uma realidade muito comum entre a maioria dos africanos e que os torna mais vulneráveis a qualquer doença). Não existe remédio específico para curar o Ebola, mas o uso de alguns medicamentos têm causado efeito positivo na cura desta doença, na medida em que agem eliminando o vírus do organismo. Um bom exemplo é o ZMapp, que contém anticorpos capazes de destruir o vírus, e tem obtido alguns bons resultados na cura de macacos, e em um grupo pequeno de teste com pessoas, que ainda está em fase de andamento.



O procedimento médico de tratar o vírus Ebola, consiste talvez mais em cuidar do que em curar.  A equipe de saúde tenta manter o paciente confortável, administra medicamentos que controlam as dores, a febre e vômitos, promovem hidratação para repor a perda de líquidos, e em um tratamento que chega a durar um mês, tenta manter o doente isolado durante a batalha do sistema imunológico do paciente contra o vírus. Depois de algumas semanas, quando o paciente já está evoluindo para a cura, aparecem alguns sinais de melhora, como a redução dos vômitos e diarréias, a recuperação do estado de consciência, a diminuição da febre, e a diminuição do sangramento pelos olhos, boca e nariz. Geralmente, após o tratamento e a cura, o paciente, ainda fica de quarenta para garantir que o vírus Ebola foi realmente eliminado de seu organismo. E mesmo na certeza da cura, como já foi debatido anteriormente, o vírus ainda pode ser transmitido por contato sexual através do sêmen.
Em geral, os sinais de piora do Ebola e os sintomas mais severos aparecem uma semana após a infecção, com manifestações diversas que podem incluir de problemas renais e no fígado, até o coma.





Médicos Sem Fronteiras

A organização MSF surgiu quando jovens médicos e jornalistas que no fim dos anos 60, em Biafra, na Nigéria, socorriam as vítimas de uma guerra civil brutal, perceberam a necessidade de melhora na ajuda humanitária e observaram a dificuldade de acesso ao local, e todas as barreiras políticas e burocráticas, que os faziam calar-se de diante de coisa horríveis. Diante disso, foi fundada uma organização humanitária, que associa ajuda médica e sensibilização da população sobre o sofrimento dos pacientes que atendem, de modo a expor ao mundo, situações que não podem e não devem permanecer negligenciadas.  O MSF leva assistência e cuidados preventivos a todo aquele que precisa de ajuda, independentemente do país, principalmente em situações críticas, e em casos de extrema urgência, como Epidemias, em que a mesma chega a fornecer água, saneamento, abrigos e alimentos, mas atua também em situações em que há problemas sérios na oferta de serviços gratuitos pra populações sem recursos financeiros.
A MSF é independente, neutra e imparcial, e escolhe, onde, como e quando agir, de acordo com sua própria avaliação. Sua ajuda pode ser disponibilidade entre 48 e 72 horas em casos de catástrofe natural, e essa agilidade é decorrente de uma lógica extremamente eficiente iniciada em 1980, no qual a organização utiliza kits pré-embalados, adaptados e personalizados para cada contexto, contendo medicamentos, suprimentos e equipamentos básicos.



A Organização Médicos Sem Fronteiras também procura sensibilizar e pressionar, juntamente a pacientes, órgãos, instituições internacionais e a indústria farmacêutica, em prol dos direitos e para que as pessoas mais pobres possam possuir medicamentos de qualidade.
Em 1999, MSF recebeu o Prêmio Nobel da Paz.

Histórias de Sobrevivência e esperança

Sobreviver ao Ebola representa vencer uma luta grandiosa contra um inimigo de armamento bioquímico adaptado, e que ataca o organismo com brutalidade.
No meio das muitas mortes, e das quatro mil vítimas desta doença, algumas histórias de vitória surgem, e são motivação para o tratamento e cura dos demais. Como é o caso do garoto Mamadee, de 11 anos, que foi admitido ao centro de tratamento de Ebola em Foya, na Libéria, no dia 15 de agosto, foi diagnosticado, se recuperou, em 19 dias de tratamento, e alegrou a todos os médicos e enfermeiros com uma dança de alegria tão inebriante e incansável que mal se podia acreditar que aquele mesmo menino tinha sido portador de uma doença tão perigosa.


Mamadee, exibindo seu certificado de cura.

A história de sobrevivência se repete também com Hawa, de 19 anos, que nasceu em Shegbwema, Serra Leoa, e foi infectada quando uma amostra do sangue de seu sogro espirrou sobre ela. Os sintomas haviam aparecido uma semana depois do contato, e começaram com dores de cabeça e febre. Hawa ficou no centro de tratamento por três semanas e só então, ganhou alta. Seu marido, entretanto, continuou no centro, tentando sobreviver a infecção, como conta a jovem:

 “Agora eu estou bem, estou forte. Quero ver minha filha, estou pronta para ver meu bebê. Eu sinto a falta dela, e sei que não há nada de errado com ela. Meu marido ficará em minha mente e em meu coração”.


Hawa, reencontrando sua filha.

Mais uma história comovente aconteceu com Jattu, seu marido e sua filha de dois anos, Rosaline, que foram diagnosticados com Ebola em uma das regiões mais afetadas do distrito de Kailahum, de nome Daru.
Após um funeral, o marido começou a se sentir mal (em postagens anteriores já foram debatidas as grandes taxas de infecção durante os mesmos), e, dias depois, Jattu e Rosaline também adoeceram. A família chegou ao centro de tratamento, com a Jattu muito doente, e com chances ínfimas de sobreviver. Felizmente, para surpresa e motivação da equipe médica, todos os três se recuperaram.



Jattu e sua filha

Essas histórias de superação englobam também Ezekial, que no centro de tratamento Elwa 3, pulou de alegria ao ser liberado, e comemorou dizendo: “Vou jogar futebol hoje mesmo”, e também o menino Patrick, cuja história comovente levou uma Psicóloga, Ane Fjeldsæter, de 31 anos, que saiu da Noruega para trabalhar com MSF em Monróvia, a escrever sobre seu trabalho com pacientes com Ebola (o texto completo poderá ser encontrado nas referências):

“A Libéria está dividida por uma cerca dupla laranja. Ela foi construída para manter a doença sob controle, para nos separar (os saudáveis, os privilegiados) deles (os doentes, os necessitados). Construímos a cerca para nos sentirmos menos mortais. E a fizemos com o nobre propósito da barreira sanitária. Patrick está no interior da cerca; eu, do lado de fora. Eu o vejo todos os dias e nós sorrimos e acenamos um para o outro. Ele é apenas uma criança, mas está brincando com meninos cinco vezes mais velhos, como se estivesse tentando compensar o fato de ser jovem demais para morrer. Eles jogam dama e pôquer, quando têm energia, e escutam a BBC Africa pelo rádio que eu trouxe um dia na minha roupa de “invasora espacial”. Patrick tem um sorriso torto, tímido, e um hematoma perto do olho direito. Acaba de perder sua mãe, mas seu pai está com ele neste lugar horrível. Todo dia eu digo a mim mesma: Ane, não perca o seu coração para esta criança que logo não estará mais entre os vivos. Ele está aqui por uma semana e, então, terá partido para sempre. Como você vai fazer o seu trabalho quando ele se for? Você não sabe com o que está lidando?”

Patrick também sobreviveu. E como ele, muitos outros doentes de Ebola, venceram a doença. Tais histórias trazem muito mais que incentivo, muito mais que alegria: elas trazem esperança. Nos centros de tratamento, muitos dos ex-pacientes retornam para ajudar os demais, e mostrar que a cura é possível, e assim, com luta e perseverança o povo africano pouco a pouco vai vencendo a luta contra o vírus Ebola.


Ezekial



Patrick e seu pai



Conclusão

O Ebola, durante sua Epidemia, abalou profundamente os países afetados. Influenciou a política, as relações entre os países, o sistema de saúde africano, causou impactos econômicos em Guiné, Libéria e Serra Leoa, nos quais multinacionais pouco a pouco encerram seus negócios, frente à ameaça do surto (A empresa Caterpillar, de máquinas e motores, retirou funcionários, a Canadian Overseas Petroleum Ltd, interrompeu um projeto de perfuração, e a British Airways, cancelou voos para a região),  e  cujos cálculos, preveem um grande défict orçamentário, na luta contra doença.
Diante disso, vê-se quão importante se torna a ajuda de instituições com a MSF, quão necessária é ajuda internacional, e qual a proporção desta guerra contra o Ebola, que as populações agora, com muita raça, felizmente,  estão começando a vencer.
E irão vencer.



Referências:

<http://www.msf.org.br/o-que-fazemos> Acesso em 06 de dezembro de 2014.




<http://www.msf.org.br/fotos/sobreviventes-do-ebola> Acesso em 06 de dezembro de 2014.