sábado, 25 de outubro de 2014

IV - A EPIDEMIA EBOLA:
O DIAGNÓSTICO E O TRATAMENTO

Entenda um pouco sobre o diagnóstico e as formas de tratamento da doença considerada por muitos a mais devastadora já descoberta na história da humanidade.





“Por que tinha remédio para os dois americanos, mas não tem para gente, africanos?”
                  
 Mamadu Bah, trabalhador de um hotel em Freetown.



Há poucos dias, uma grande confusão se iniciou em Serra Leoa, quando uma equipe de médicos tentou tirar uma senhora de 90 anos, (com suspeita de estar infectada com Ebola), de sua residência e transferi-la para uma quarentena. Segundo um repórter correspondente da BBC, a primeira reação foi apresentada pelo filho da mulher, que se pôs a atirar pedras nos médicos.  Depois disso, outras pessoas da cidade, indignadas com a falta de locais e condições de tratamento, acabaram por aderir ao protesto e iniciaram um quebra-quebra no distrito de Kono, que se situa no leste de um dos países mais afetados pela epidemia do ebola no oeste da África, que no total, já matou 4500 pessoas.  Em reação à manifestação, a polícia abriu fogo contra a população e tentou, pela imposição de um toque de recolher, conter a revolta. 

Tais ações propiciaram que a equipe médica fugisse do local e se protegesse em um hospital próximo, no entanto, não mudou e nem muito menos atenuou, a realidade da indignação da população destes países, que está cansada de viver à margem do mundo capitalista e de, por muitos anos, (e ainda nos dias atuais), ser “deixada para morrer”, em uma luta contra um vírus muito perigoso, e forte demais, para o frágil sistema de saúde de que seus países dispõem.
A citação que inicia essa postagem, e a revolta popular em Serra Leoa, é uma prova real disso. A triste realidade é que o tratamento do Ebola ainda é ineficiente, que os hospitais estão superlotados e sem quase nenhuma infra-estrutura para o tratamento dos muitos doentes, (o que acaba ocasionando que pessoas morram ou de Ebola, ou da falta de atendimento a outras doenças tropicais), que as vacinas e estudos estão atrasados demais, e, como dizem muitos especialistas, talvez não fiquem prontas até o final deste surto, e que, mesmo os testes, são aplicados somente em americanos e europeus, como a da empresa americana Zmapp, que foi administrada a dois médicos americanos infectados, mas não o foi, nem no médico Umar Khan, um herói de Serra Leoa, que tratou cem doentes de Ebola, antes de morrer infectado, e nem muito menos nos outros africanos.
A postagem desta semana, em evidente sequência às três passadas que explicaram sobre a origem do Ebola, seus tipos, sintomas, formas de contágio, evolução, transmissão e prevenção, abordará agora aspectos gerais do tratamento desta doença, desde o diagnóstico, até a possível cura.




O diagnóstico

A grande dificuldade para se estabelecer um diagnóstico precoce da Febre Hemorrágica Ebola, é que no início, os sintomas podem ser confundidos com os de diversas outras enfermidades como gripe, dengue hemorrágica, malária e febre tifóide. Desta forma, além dos sintomas, outros fatores podem ser muito determinantes, como o levantamento da história do paciente, que serve muito a ponto de identificar se o mesmo esteve exposto a situações de risco (como por exemplo, se ele vive ou viajou para regiões onde a doença se manifesta em surtos, como na África subsaariana), o resultado de testes sorológicos (Elisa IgM, PCR), e uma análise de sangue para detectar a presença de anticorpos, de DNA do vírus, ou do próprio vírus,  que são fundamentais para determinar o agente e a causa da infecção.
Diante da possibilidade de alguém estar contaminado com o Ebola, o mesmo deve ser mantido em isolamento ou quarentena, e os serviços de saúde devem, obrigatoriamente, receber uma notificação.

O atual tratamento

O vírus Ebola, possui cepas infecciosas que podem provocar febre hemorrágica severa, e que em estágios avançados, leva a sangramentos de olhos, ouvidos, nariz, boca e reto. Ele infecta adultos e crianças sem distinção, é transmitido aproximadamente para 17 outras pessoas, a cada grupo de 10 infectados, e uma de suas cepas, o Zaire, é um dos vírus mais mortais conhecidos, e que mata em até 90% dos casos.




Atualmente, não existe um tratamento específico e nem muito menos uma vacina para o Ebola (um tratamento chamado de siRNAs tem uma alta taxa de sucesso, mas apenas se administrado minutos após a infecção), e a verdade, é que o único recurso terapêutico contra a infecção, é oferecer medidas de suporte, contenção e cuidados paliativos, na tentativa de amenizar os muitos sintomas da doença, como reposição de fluidos e eletrólitos, hidratação venosa, controle da dor, da pressão arterial, da febre, dos níveis de oxigenação do sangue, e prevenção e o tratamento de complicações que possam surgir.
Existem dois centros de referência no Brasil, ambos no sudeste, que se mostram preparados pra receber e tratar pacientes infectados pelo Ebola: o Hospital Emílio Ribas, em São Paulo e o Fiocruz, no Rio de Janeiro.

O que diz a OMS

Marie Paule Kieny, a representante da OMS, confirmou que um novo tipo de tratamento chegará à África em breve e de que novos remédios estejam disponíveis para uso em janeiro de 2015. Tal notícia refere-se ao recém-descoberto “serum”, que é feito a partir de amostras de sangue de pessoas curadas do Ebola. A ideia consiste no fato de que o sangue de quem sobreviveu ao vírus teria anticorpos capazes de combater o mesmo, e por isso, tem-se esperança que ao aplicar esses anticorpos em pacientes, os mesmos poderiam ser auxiliados na luta contra o vírus.
Em outras declarações, a organização defendeu que no Reino Unido e nos Estados Unidos, testes de segurança para duas vacinas experimentais estavam sendo realizados, e que seriam expandidos em breve, para dez locais na África, Europa e América do Norte.



Proteínas na luta contra o Ebola

Um novo estudo, publicado na Science Translation Medicine, realizado por uma equipe de pesquisadores canadenses, usando um vírus 7U que continha aproximadamente 80% da população natural, mostrou que um tratamento combinado de proteínas e anticorpos eficientes na luta contra vírus, associado a interferon vetorizado e adenovírus (uma proteína que ajuda a ativar o sistema imunológico e é preparada com material viral), evitou a morte de alguns primatas infectados com o Ebola-Zaire, a cepa mais perigosa do Ebola, mesmo que a administração do medicamento tivesse se dado três dias após a infecção, já quando os primeiros sintomas começavam a aparecer. O estudo se baseia em trabalhos anteriores na área, e usa um medicamento feito a partir de três anticorpos de ratos.



A partir deste estudo, pode-se concluir que os anticorpos podem controlar o modo de replicação do vírus Ebola e, o mais crucial: que combinados, também poderiam ampliar o tempo pra o tratamento da doença, revelando que talvez, o medicamento para Ebola poderia se resumir a uma combinação dos tratamentos mais promissores – como tratamentos de HIV. O próximo passo da equipe de pesquisadores será trabalhar com um novo grupo de anticorpos, em busca de um coquetel que estenda um pouco mais a janela de tempo.

Nota de fim de post...

No tempo em que levei para escrever esta postagem, o que se deu em aproximadamente seis horas, é provável, segundo as estatísticas da ONG Save the Children, que em Serra Leoa, mais 30 pessoas tenham sido diagnosticadas com Ebola, e que muitas crianças tenham morrido à míngua pelas ruas africanas, ou mesmo em casa, sem nunca serem contabilizadas no número total de vítimas, (que mesmo sem elas, já é absurdamente alarmante), e tenham provavelmente, por causa justamente da falta de atendimento e informação, infectado seus parentes mais próximos, e contribuído ainda mais para a saturação extrema do sistema de saúde dos países africanos atingidos (mais sobre isso será tratado nas postagens seguintes).
É preciso, urgentemente, que as pesquisas focadas no vírus Ebola, tanto as citadas nesta postagem, como as demais, recebam financiamentos e concluam o mais rápido possível. É preciso, como já defendi anteriormente, que os países se mobilizem, e que os povos atingidos recebam doações, médicos, aparelhos e materiais de segurança. E é preciso, por fim, que a OMS cumpra a previsão e que em janeiro próximo, a vacina já venha a ser ministrada nas áreas afetadas.
Resta, porém, a grande questão: Quantos mais morrerão até lá?





Em breve...
Sobre o Ebola, muitas perguntas podem surgir:
Qual a população mais atingida? Quais países sofrem a epidemia atual? O que é MSF e quais os riscos dos profissionais da saúde que trabalham com o Ebola? Tem Ebola no Brasil? O Ebola seria um grandioso embuste? Quais as relações entre a doença e a sociedade africana? Como se dá a Bioquímica do Ebola?
Esses são alguns dos assuntos que serão trabalhados nas próximas semanas.
Até. 


Referências:




<http://drauziovarella.com.br/destaque2/ebola/> Acesso em 25 de outubro de 2014.

<http://www.scielosp.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0042-96862000001200019&lng=pt&nrm=iso>  Acesso em 25 de outubro de 2014.


<http://www1.folha.uol.com.br/colunas/patriciacamposmello/2014/08/1503672-por-que-estou-aqui.shtml>  Acesso em 25 de outubro de 2014.

7 comentários:

  1. A situação retratada no início do post é incrivelmente semelhante à Revolta da Vacina ocorrida no Rio de Janeiro no início do século XX, onde uma população também marginalizada se levantou contra medidas compulsórias elaboradas com o objetivo de erradicar doenças. O problema em ambas residiu no fato de que foram medidas tomadas por classes mais elevadas sem a participação dos principais afetados, sendo de certo modo uma "invasão" à vida das pessoas, principal motivo de revolta. Quanto ao diagnóstico da doença, é válido acrescentar que alguns dias depois do início dos sintomas são usadas a análise de imunoadsorção enzimática ou ELISA de captura de antígeno, ELISA IgM, reação em cadeia de polimerase (RCP) ou isolamento do vírus; em etapas mais avançadas e logo após a recuperação são usados as provas de anticorpos IgM e IgG; e em forma retrospectiva para pacientes já falecidos são usados prova imunohistoquímica, RCP e isolamento do vírus.
    Fonte:http://www.cdc.gov/vhf/ebola/spanish/diagnostico.html

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  2. Podemos perceber, pelas informações fornecidas pelo texto, o quanto o problema do Ebola abrange muitos âmbitos, não só aqueles voltados à saúde, especificamente. É de fato muito difícil controlar esta doença, pela sua patogenicidade e transmissibilidade, mas sobretudo pelos impasses encontrados perante uma população cheia de crenças e culturas enraizadas, que muitas vezes veem os médicos como vilões (o que não é de se estranhar, visto que a África sempre foi subjugada) e do outro lado médicos, enfermeiros e cuidadores em geral que se veem na situação de não haver a mínima infraestrutura para lutar contra esse mal, tendo que expor, mas do que já fazem, suas vidas ao risco que serem contaminados também. Como citado no post é preciso que olhem mais pela África nesse momento, que os países se mobilizem, que não se enganem em achar que a situação está se controlando, por que não esta, as mortes ainda são muitas. Em relação as formas de tratamento, a Suíça iniciará, na próxima sexta-feira (31), os primeiros testes de uma vacina experimental contra o vírus ebola, desenvolvida pela farmacêutica britânica GlaxoSmithKline. A vacina já está sendo testada no Reino Unido, nos Estados Unidos e em Mali, na África. Os testes serão feitos no Hospital Universitário de Lausanne, com a participação de 120 voluntários e suporte da Organização Mundial da Saúde (OMS). Os pacientes serão monitorados durante seis meses – tempo suficiente para avaliar a segurança e eficácia da vacina. Entre os voluntários estão estudantes de medicina e profissionais de diferentes áreas de saúde, que viajarão para o território africano, onde vão ajudar a combater o ebola.

    http://www.emtempo.com.br/suica-inicia-testes-de-vacina-contra-ebola/

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  3. A falta de um tratamento eficiente é motivo de desespero para a população local, ocasionando a revolta citada. Mesmo em regiões distantes as pessoas ficam assustadas com a possibilidade de contrair uma doença que foi minimamente estudada. Nesse contexto, a possibilidade de desenvolvimento de remédios a partir de anticorpos de sobreviventes e proteínas é vista como uma esperança.
    O médico Paulo Reis, que trabalhou com vítimas de ebola em Serra Leoa, afirmou que há um fator a mais que dificulta o tratamento na região. A roupa de proteção, extremamente necessária ao lidar com o ebola, soma-se à temperatura de 40°C originando um calor que afeta os profissionais de saúde.
    FONTE
    http://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2014/08/21/tratar-pacientes-com-ebola-e-tao-perigoso-quanto-andar-no-transito-do-rio.htm

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  4. A atual falta de proteção e tratamento contra o vírus ebola e a mortalidade do mesmo são os fatores que mais assustam, tanto a população que já vinha sofrendo com isso (do continente africando) quanto o resto do mundo, que finalmente está atento aos avanços da doença. Vários medicamentos antivirais e vacinas experimentais estão sendo preparados como resposta inicial à epidemia sem precedentes do vírus ebola, que assola o oeste da África. Nenhum deles foi homologado para tratar, especificamente, o ebola. Um tratamento disponível é o ZMapp, que é um coquetel de três anticorpos "monoclonais", desenvolvido pela Mapp Bio (Biopharmaceutical), em parte, derivado do tabaco, graças ao laboratório Kentucky BioProcessing (filial da fabricante de cigarros) e à engenharia genética. Nunca testado anteriormente em humanos, apesar de ter obtido resultados relativamente bons com os macacos, este medicamento foi utilizado para tratar pelo menos sete pessoas: dois americanos ficaram curados, um padre espanhol e um médico liberiano morreram, e um médico e um doente liberiano, assim como um doente britânico repatriado de Serra Leoa, estão sendo tratados. Contudo, as reservas deste tratamento já se esgotaram, indicou a empresa no dia 12 de agosto. Seriam necessários vários meses antes de obter uma "quantidade modesta", segundo Anthony Fauci, diretor do instituto americano de alergias e doenças infecciosas (NIAID/NIH).

    Fonte: http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2014/08/saiba-quais-sao-os-tratamentos-existentes-contra-o-virus-ebola-4584692.html

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  5. As decisões terapêuticas que envolvem o ebola devem ser tomadas com base num cálculo que pese os benefícios reais e potenciais contra os riscos conhecidos. No caso específico do Zmapp, a droga que ficou nos holofotes da mídia depois de ser aplicada a dois americanos, não há certeza quanto a seus reais efeitos. Levando-se em conta que não há um tratamento próprio contra o ebola, torna-se impraticável sustentar a necessidade de seguir os trâmites normais de licenciamento - que demandam anos de pesquisas - antes de liberar o medicamento para uso humano. Ao menos por enquanto, os esforços para conter essa epidemia dependem de medidas tradicionais, como tratamento sintomático, isolamento dos infectados e monitoramento das pessoas que estiveram em contato próximo com eles.

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  6. A revolta citada no inicio da postagem mostra quão abrangente é esse tema sobre ebola, haja vista ele engloba não só os problemas causados pela doença, como também a péssima infraestrutura nos hospitais e no combate a doença oferecida pelos governos, principalmente na África, que é o local que mais abrange incidências da doença. Para amenizar esse desespero da população com relação a doença, vários medicamentos antivirais e vacinas estão sendo preparados como forma de combate à doença, principalmente os que são desenvolvidos a partir de anticorpos de sobreviventes. Um tratamento disponível e que já foi testado em animais é o Zmaap, que é um coquetel de anticorpos, porém não se sabe ainda o seu real impacto no organismo humano, já que só foi usado em poucas pessoas. Logo é importante realizar como uma medida de impedir a maior transmissão dessa doença medidas preventivas e ter o maior cuidado com os doentes, para evitar contaminação das pessoas sadias.

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  7. O tratamento ainda não existe, mas é bem provável que em pouco tempo esteja disponível no mercado para quem (governos ou pessoas) possui poder de compra. Ou seja, para os africanos só nos pesadelos mais absurdos dos sonháticos. Ou ainda, podem até receber algum remédio (ou vacina), mas não com a intenção de ajudá-los, apenas limpando o vetor do mal que assusta o mundo "civilizado".

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