IX
- A EPIDEMIA EBOLA:
VÍRUS
EBOLA: O SEGREDO DO SUCESSO
Entenda um pouco sobre o vírus causador da doença considerada
por muitos a mais devastadora já descoberta na história da humanidade.
"Nós não
somos os hospedeiros naturais do vírus Ebola, que não evolui em nós."
(Tradução do autor do blog, da frase original em inglês)
Vincent
Racaniello,
Columbia
University's Medical School
Muita coisa tem
se falado sobre o vírus Ebola nos últimos meses, e muito do que preenche o
conhecimento da população sobre esta doença está ligado ao seu potencial
mortífero, às inúmeras vítimas, aos países africanos atingidos, e aos sintomas
terríveis, dentre eles, o vazamento de sangue pelos poros, o mais temível e
conhecido.
Entretanto há
pessoas que conseguem fazer dinheiro com uma versão do vírus Ebola muito mais
bonita e consideravelmente menos perigosa que, embora pareça estranha a
primeira vista, fez um enorme sucesso de vendas nos Estados Unidos e esgotou rapidamente o
estoque. Você daria para o seu filho um belo ursinho de pelúcia do vírus Ebola?
Por mais que pareça estranho e totalmente inesperado, a réplica da doença que já matou mais de 4.500 pessoas no mundo todo, de acordo com a OMS, está fazendo um enorme sucesso.
Por mais que pareça estranho e totalmente inesperado, a réplica da doença que já matou mais de 4.500 pessoas no mundo todo, de acordo com a OMS, está fazendo um enorme sucesso.
A empresa Giant Microbes, que se destaca produzindo diversos
micróbios de pelúcia, relata sobre este assunto por meio do depoimento de sua
gerente Carol Allam:
“Nós temos o boneco do ebola há anos, mas agora todo mundo está procurando um. Vendemos milhares nos últimos meses. Estão esgotados. Acho que é porque eles são muito parecidos com os de verdade. Se você olhar em um microscópio, verá que a forma do vírus é igual à do boneco”.
O objetivo da
empresa seria criar algo que fosse educativo, e não apenas um brinquedo, e que
de forma lúdica, fizesse com que as pessoas pudessem interagir, por exemplo,
com o vírus da Aids, com a Pneumonia, a Rubéola, o Botulismo e etc. (O Ebola e alguns outros da coleção estão nas fotos abaixo, sendo o último - na foto isolada, e de cor preta - o vírus da Aids), aprendendo
durante este processo (alguns vírus ganham características das doenças com as quais se relacionam, como por exemplo a gripe suína, que tem nariz de porco).
Das réplicas do famoso vírus Ebola (que tanto tem sido foco das reportagens deste ano), só sobraram doze exemplares de 60 cm, que aguardam uma possível nova produção.
Das réplicas do famoso vírus Ebola (que tanto tem sido foco das reportagens deste ano), só sobraram doze exemplares de 60 cm, que aguardam uma possível nova produção.
Durante todas as
nossas postagens temos tentado decifrar este pequeno organismo, que é o vírus Ebola de modo a
entender o seu mecanismo de ação, partindo dos tipos, sintomas que provoca no
organismo, modo de contágio e, mais recentemente, decifrando o aparelho
bioquímico. Entretanto, o
vírus Ebola não é tão simples e fácil de lidar como a bela e cômica réplica que
inicia esta postagem, e nessa semana, mais uma vez, tentaremos entender como se
dá diversos processos, principalmente de cópia e evolução do vírus, e mais: citar as características próprias que o tornam tão especial.
Quem
sou eu? O vírus Ebola.
O Ebola é um vírus RNA, da família
Filoviridae e do gênero Filovirus, altamente infeccioso e mortal, que tem cerca
de 19 mil bases de comprimento, sete genes (a maioria dos quais codificam proteínas
que constituirão a estrutura do mesmo), estrutura básica e filamentosa, e potencial epidêmico médio em relação a outras
grandes doenças. Possui, (como já foi discutido em postagens anteriores), cinco
formas reconhecidas, que variam entre si na sequência de bases dos RNAs e em
aspectos sorológicos, e que recebem o nome do local onde foram descobertas
primeiramente, (Bundibugyo, Costa do Marfim, Reston, Sudão e Zaire), sendo que
destes, quatro causaram o surto, já que, embora o Reston possa infectar
humanos, nenhuma enfermidade ou morte foi relatada. O Ebola está no estágio 3
de contaminação, no qual, como foi discutido na segunda postagem, o micróbio pode
passar para o ser humano, e ocasionar ciclo de transmissão entre humanos, que entretanto
não se mantém sozinho.
O vírus está presente em altas
quantidades nos fluidos corporais que vazam de vários tecidos nas pessoas que
estão morrendo da infecção, e o resultado mais direto e consequente, é que as
pessoas com maior risco de novas infecções são aquelas que se importam com os
mais doentes ou aqueles que lidam com os corpos dos parentes falecidos, (ou mesmo
que dos que são deixados para trás), ainda, que o vírus possa ser também
transmitido por menor contato, embora que mais dificilmente.
A transmissão do vírus Ebola se
torna mais fácil apenas depois que os pacientes começam a perder líquidos em
grandes volumes, e este momento corresponde justamente àquele em que o paciente
necessita de mais cuidados, o que acaba expondo a um alto risco os médicos,
outros profissionais de saúde, familiares, e amigos próximos, que chegam a ter
80% de chance de contrair a doença.
Mesmo que seja
um vírus altamente mortal e tenha provocado uma grande número de óbitos no prolongado surto
atual, o Ebola não é eficiente em espalhar infecções. O surto vem acontecendo desde
dezembro do ano passado e só agora viu a infecção 10000, o que é pouco, comparado
a uma cepa de gripe, que no mesmo tempo, provocou muitas mais mortes a nível
mundial, em taxa de infecção de 10-15% da população das áreas afetadas.
Ainda assim, o
Ebola possui uma forma de disseminação eficaz, que encontrou seu jeito de
atacar a saúde humana. Vincent
Racaniello, da Universidade de Columbia University's Medical School, defende que nós não somos os
hospedeiros naturais do vírus e que o mesmo não evolui em nós (embora sofra
pequenas adaptações, que acabam se perdendo), de forma que cada surto que já
ocorreu foi uma inteiramente nova transferência de um vírus para os seres
humanos.
A
rota do Ebola e a possibilidade da evolução
Mesmo que ainda
existam grandes incertezas a respeito de como o Ebola faz seu caminho para os
seres humanos, as evidências sugerem que o reservatório natural seja o morcego,
o qual poderia transmitir a doença aos humanos através de frutas mordicadas, ou
mesmo, ao servir de alimento.
Entretanto, caso
o vírus Ebola consiga continuar circulando em hospedeiros, tal realidade de
transmissão pode mudar na medida em que o mesmo tem o potencial de se submeter
a uma adaptação significativa, já que as Polimerases de RNA que o vírus utiliza
para duplicar seu genoma são propensas a gerar novas mutações, devido a erros
na cópia do vírus, e à ausência de uma função chamada revisão (que geralmente
cabe a enzima responsável pelo processo da cópia, que pode, por exemplo,
reconhecer erros na sequência das bases, fazer backup e tentar novamente). Sem
revisão, a enzima do Ebola não pode tomar outra decisão, senão deixar o erro no
lugar e seguir em frente, resultando em uma taxa de falha, de 1 para cada 10000
bases. Lembre-se que, como foi dito no item anterior, o Ebola possui 19 mil
bases, o que significa que todo vírus, dentre os milhares que são produzidos
por uma célula infectada, é suscetível de conter pelo menos uma mutação.
Em certa medida,
os vírus tendem a se adaptar aos seus hospedeiros, de forma a mantê-los vivos
por mais tempo, para servirem como um maior grupo potencial de fábrica de vírus, (tipo de coisa que o Ebola ainda não consegue fazer), ou ainda evoluir de forma a se espalhar de
modo mais eficiente.
Tem-se tido
grande preocupação de que este último evento acontecesse primeiro, e o vírus Ebola
conseguisse ser transmitido através de partículas do ar, mas essa
possibilidade, embora perigosa, é de pouca probabilidade, devido a este evento de evolução ser
extremamente raro.
Próximas
descobertas?
Os vírus de
febre hemorrágica têm atraído a atenção da comunidade científica há varias
décadas, sendo o Ebola, a mais recente grande preocupação, devido ao surto que
vem matando em massa a população africana. Apesar dos esforços que se tem
feito, (muito tardios, diga-se de passagem), um tratamento realmente eficaz
ainda precisa ser descoberto e as vacinas, submetidas a testes significativos.
Como já foi
debatido desde a primeira postagem, parte da dificuldade e da falta de
progresso em relação às pesquisas com o Ebola é decorrente da negligência das
indústrias farmacêuticas e centros de pesquisas, (que não veem na doença uma
forma de lucro ou mesmo ameaça), mas outro grande obstáculo se encontra também
na própria natureza mortal do vírus Ebola, que dificulta em grande parte as pesquisas,
na medida em que se precisa trabalhar com ele, em BSL-4, em relação ao nível de
biossegurança, (lugares especializados esses que só existem em número de 20 nos
EUA e não muito mais do que isso no restante do mundo), o que acarreta menor
progresso em relação ao vírus da gripe, sarampo, ou poliomielite, por exemplo.
Enquanto não se investir mais nas descobertas citadas acima, ou na construção de mais laboratórios especializados, ou mesmo no direcionamento maior das pesquisas para o Ebola, este surto dificilmente poderá ser parado antes que mais e mais pessoas morram.
Enquanto não se investir mais nas descobertas citadas acima, ou na construção de mais laboratórios especializados, ou mesmo no direcionamento maior das pesquisas para o Ebola, este surto dificilmente poderá ser parado antes que mais e mais pessoas morram.
Em breve...
Sobre o Ebola, muitas perguntas podem surgir:
O que é MSF e quais os riscos dos profissionais da saúde que
trabalham com o Ebola? É possível a cura total? Tem Ebola no Brasil? O
Ebola seria um grandioso embuste? Qual a Bioquímica do Ebola?
Esses são alguns dos assuntos que serão trabalhados nas próximas
semanas.
Até.
Referências:
<http://evunix.uevora.pt/~sinogas/TRABALHOS/2000/virol00_Ebola.htm>
Acesso em 28 de novembro de 2014.
<http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/2014/08/1507520-sequenciamento-do-genoma-do-ebola-revela-como-virus-cruzou-fronteira.shtml>
Acesso em 29 de novembro de 2014.
<http://arstechnica.com/science/2014/11/understanding-the-ebola-virus/>
Acesso em 29 de novembro de 2014.
<http://extra.globo.com/noticias/mundo/ebola-de-pelucia-faz-sucesso-nos-estados-unidos-14346283.html>
Acesso em 29 de novembro de 2014.